Tuesday 15 September 2015

E ainda a propósito...



 ...destes dias conturbados, mais um excerto do Livro de Jade do Céu. Os protagonistas, Luana e Michel chegam a Amã, capital da Jordânia.

"À saída do aeroporto, Michel avançou carregando a sua própria bagagem e outra mala menor que Luana decidira levar com algumas ferramentas necessárias para a escavação. O Arcanjo caminhava com passos apressados e só parou na primeira banca de publicações que encontrou. Depois de comprar o Al Fajhr, um jornal palestiniano, esperou pacientemente por Luana e Gabriel. Mais fascinados com o mundo novo que se abria em frente dos seus olhos, do que apressados para chegar ao hotel, acabaram por ficar para trás.
– É tão urgente assim saber as notícias locais? – perguntou a Guardiã aproximando-se de Michel.
– É bom saber com o que podemos contar – respondeu o Arcanjo, dando uma vista de olhos pelas páginas centrais.
– E quais são as principais notícias? – voltou a indagar curiosa.
– Fala sobre alguns acontecimentos que marcaram o ano. A onda de violência que varre a região do Oriente Médio, não vai ser esquecida tão cedo. A Primavera Árabe ainda está longe dos seus ideais.
– Pois. Não é fácil esquecer. A Síria, por exemplo, está assolada pela guerra civil. O presidente Bashar Al-Assad segue com promessas de esmagar o inimigo com mão de ferro. Os civis são alvos em todo o país. Agora não sei quantos são, mas não há muito tempo li uma notícia que dava conta de mais de 500 mil refugiados e mais de 40 mil mortos.
– Não há cessar-fogo, nem acordo de paz, Luana. O conflito extrapolou as fronteiras e tanto a Síria como a Turquia estremeceram. A Rússia e a China são grandes aliados do governo, mas outras 100 nações reconhecem que a oposição é a legítima representante do país. – referiu o Arcanjo.
Continuaram parados em frente um do outro na beira do passeio. Durante uma breve fracção de segundos, os seus olhares cruzaram-se e deixaram escapar a paixão que os invadira na véspera. Contudo, cientes de que não podiam deixar que Gabriel percebesse o amor que os unia, optaram por disfarçar, desviando os olhares para o espaço circundante na tentativa de descobrirem Gabriel. Avistaram-no alguns metros à frente, a tentar fazer parar um táxi. Baixaram então de novo os olhos para as páginas do jornal.
– E como se isso não bastasse, o Irão teima em seguir com o seu programa nuclear. Se bem me lembro, até já ameaçou um navio de guerra americano e fez testes com mísseis no estreito de Ormuz – referiu Michel resignado à necessidade de esconder os seus sentimentos.
– Este foi um ano de atentados devastadores no Iraque, no Líbano e no Afeganistão, mas a Primavera Árabe dá alguns sinais, Michel. O golpe de Estado no Iémen pôs fim a três décadas de poder de Ali Saleh. Na Tunísia, o ex-ditador Ben Ali foi condenado à prisão perpétua, a mesma punição de Hosni Mubarak. E o ex-presidente do Egipto chegou a ter a morte anunciada.
– Mas não confirmada – ripostou ele.
– É verdade. E enquanto tudo isso, na Praça Tahir, no coração do Cairo, os protestos foram uma constante este ano – relembrou Luana.
– Os egípcios entraram em 2012 a exigir a saída dos militares do poder. Nas eleições, elegeram Mohamed Mursi, da Irmandade Muçulmana, mas ele enfrenta uma crise após a outra. Ainda é frágil a democracia no país.
– Hum... e pelo que vejo aí também é frágil o cessar-fogo entre Israel e a Autoridade Palestiniana – constatou ela, dobrando a folha do jornal para conseguir ler melhor a notícia. – Por isso é que este ano, a escalada de provocações já vai com um ataque aéreo fulminante. O líder militar do Hamas foi morto na Faixa de Gaza e o que está a suceder deixa o mundo assustado.
– E há razões para isso. Mas vê bem a votação histórica na ONU: a Palestina foi elevada a estado observador. Contudo, receio bem que este ano vá chegar ao fim com as mesmas velhas dúvidas. – São também as minhas dúvidas, Michel. A paz virá algum dia? –
perguntou Luana contemplativa.
– Acredito que sim. Tu não?
– Espero que sim. Talvez aconteça um milagre e os governantes dos países em conflito ganhem juízo e comecem finalmente a fazer aquilo para que realmente foram eleitos: cuidar do povo que os elegeu". 




In "A Guardiã- O Livro de Jade do Céu"