Sunday 14 September 2014

AS “estampas” da nossa vida…


Acredito que todas as mulheres têm outra mulher pela qual, em algum momento das suas vidas foram trocadas. Essas, as que nos levaram algum dia ao término de uma relação, se forem tão ou mais bonitas que nós (e nós temos olhos na cara para ver isso) até compreendemos. (Não no momento, mas mais tarde). Mas quando isso não acontece, quando o homem que amávamos ou nos dava pelo menos a volta aos sentidos, nos troca por alguém francamente pior, então esse facto transforma para todo o sempre, a outra, (a ladra), numa "estampa". Uma croma purulenta, vurmosa e infecta. Eu tenho uma "estampa". Ou duas. A minha amiga também tem uma e não deve haver mulher que não tenha a sua. Até mesmo as próprias “estampas” são bem capazes de ter um destes exemplares a assombrá-las, por mais difícil que isso nos pareça. Mas confiando na lei de Murphy, temos que acreditar que há sempre pior.
A primeira “estampa” que a vida me deu, foi há uns bons anos atrás. Tinha então 15 anos. Era a minha primeira paixoneta, coisa de adolescente e nunca passámos dos beijinhos. Mas eis que surgiu a primeira larápia dos meus afectos. Era já na altura uma miúda feia, com um nariz demasiado pontiagudo, demasiado sardenta, com uns olhos pequeninos e apagados. Nada de interessante portanto. Mas ela somou e seguiu e uma noite, em que eu estava num bailarico da aldeia, cheia de esperança de o ver (a ele), encontrei-o aos beijos com aquela coisa achinesada, atrás do palco de onde ressoava a cacofonia pimba. Tudo bem. Tinha 15 anos. Facilmente parti para outra, depois de ter chorado 3 dias seguidos. Não há muito tempo, encontrei-os aos dois, também numa festa da aldeia, mas já não os vi aos beijos. Ele tinha uma bebedeira descomunal e ela, ao nariz em forma de gancho e olhos mortiços, somava um buço que vai daqui a Paris. Ele estava coxo, marreco, e com um rosto enrugado e macilento, marca de muitas noites bem regadas a álcool. Nunca largava a cerveja e ela agarrava-se ao balcão do bar improvisado, olhando para ele de soslaio, volta e meia dizendo-lhe qualquer coisa. Parecia zangada. Até que a “coisa” deu para o torto e ele deu-lhe um estalo tão grande que ela rodopiou para o outro lado do balcão. Veio ajuda. Alguns homens agarraram-no e ralharam-lhe por ele estar a fazer aquelas figuras tristes. Mas ele continuava a falar alto e a chamar à mulher todos os nomes de que se lembrava. Até que cambaleante, seguiu para casa com ela atrás. «Coitada.» Ouvi dizer, «Hoje é mais uma noite em que ela vai apanhar e acabar a dormir na rua.» Foi quando me lembrei dos meus 15 anos e daqueles 3 dias de pesar por ter sido preterida. Não consegui deixar de sorrir quando pensei : “Abençoadas lágrimas. Esta levou-o, mas não levou grande coisa.” Alívio. Alívio não, gratidão mesmo. Felicidade extrema!
Ontem uma amiga, mostrou-me uma foto em que posava alegremente a “estampa” dela. Fiquei chocada, horrorizada a olhar para aquilo. A única imagem que me veio à cabeça foi a de um travesti que encontrei a deambular pelas ruas do Porto, na década de 80. Podia jurar que se tratava da mesma pessoa. Receei ter pesadelos ontem à noite. Se ao invés de loura (falsa), ela tivesse o cabelo preto, podia bem passar pela matriarca da família Adams. E isto levou-me (como era esperado), a recordar-me da minha estampa mais recente. Outro “mistério da fé” que eu nunca vou perceber. É claro que eu não me acho linda de morrer, nem tenho a pretensão de ser o máximo que algum homem pode desejar (era o que faltava!), tenho plena consciência de que não subo ao pódium dos cânones da beleza feminina, mas por amor da santa! Aquilo é pior que uma albina! Aposto em como ele consegue ver-lhe a comida no percurso que faz da garganta ao intestino grosso! Tem sinais na pele (até onde se pode ver), com diâmetros que davam para fazer ringues de patinagem artística! O rosto é tão parco em harmonia que me dá a sensação de que o Criador (faltando-lhe peças), foi buscar aos falecidos, uma orelha aqui, outra ali, o nariz dacolá, o olho direito deste e o esquerdo daquele…C’órror! E o gosto pela roupa e acessórios? Será que ela não tem amigas? Sim, amigas de verdade que sejam capazes de lhe dizer: “ Querida, isso não te favorece…e é pindérico.” Enfim…
A minha amiga, a tal que foi trocada por um travesti, que é bonita e tem um charme de fazer inveja, anda com a foto da sua “estampa” no telemóvel. E a razão é muito boa: “ Quando estou com uma crise de auto-estima – confessou-me – olho para ela e sinto-me logo muito melhor.” Nunca tinha pensado no quanto isto é terapêutico. Acho que vou fazer o mesmo à minha. Download da foto que há tempos consegui apanhar no Facebook e sou capaz de ir um bocadinho mais longe: Imprimir e colar em pontos estratégicos da casa. Sei que é cliché mas é bem capaz de funcionar: Uma na dispensa para afastar as formigas e outra na casa de banho para me estimular o recto em dias de obstipação. Fica bem mais económico do que o Dulcolac e o Activia e é bem capaz de surtir o mesmo efeito.