Wednesday, 9 November 2016

E então, eis a matéria de que sou feita:



 A(na)tomicamente predisposta à mudança, ao risco, e isto é, em primeira, segunda ou última instância, Viver. 
Primeiro que nada a queda. O salto sem pára-quedas no vazio, o embate doloroso na rocha nua, a dor, os rasgões, a alma a contorcer-se num oito. Depois, bem... depois há sempre uma brisa que me seca as lágrimas. Ressurjo do meu féretro, desenrolo-me como um bicho de contas que se abre e esperneia. Espeto o indicador a perceber a direcção do vento e sigo. Dorida. Sofrida. Mas avanço convicta de que ficar ali no meio da dor tem o seu tempo útil, e o tempo útil é apenas aquele que é usado para entendê-la, o tempo suficiente para dissecá-la, para esquartejá-la, esmiúça-la. No fundo, torná-la, não pequenina ou insignificante, mas transportável. Não há dor que não possa ser usada como um bom manual. Por isso, carrego sempre as minhas dores. Não ao alcance do meu coração, mas sempre na orla da minha mente. O aprendizado emerge delas e isso, apenas isso, dá significado a qualquer momento em que me sinto ruír, em que me sinto rasteira, derrotada. A dor acaba sempre por me ensinar quão bem vindo é cada minuto que eu tenha, algum dia, amaldiçoado.


Ana Kandsmar in Mar de Deus

A noite mais longa: nós, os "deploráveis", tínhamos razão!

Que se ponham os olhos na América. Oxalá Trump venha a ser o presidente que a América e o mundo precisam. Mas esta vitória é antes de mais, o grito preocupante da revolta de quem sistematicamente é deixado para trás, esquecido pelos ricos que ficam cada vez mais ricos. O mundo está a mudar, não haja duvida. Os poderes instalados, os partidários do sistema fraudulento e corrupto terão que ser corridos das suas redomas, onde têm, ano após ano, década após década, estado a salvo da miserável existência das maiorias. Eu, para já, aplaudo Trump.

A noite mais longa: nós, os "deploráveis", tínhamos razão

Foi, sem dúvida, uma daquelas mudanças que marcam o curso da história. Para quantos se deixam dominar pela sua subjectividade, gostos, inclinações e desejos, esta noite que mudou o mundo foi recebida com choque, surpresa, indignação e estupor. Tive imensos problemas por haver formulado a possibilidade da vitória de Trump.
Amigos houve que me chamaram tudo por alinhar aqueles argumentos de racionalidade que, afinal, coincidiam perfeitamente com a percepção que os norte-americanos exibem a respeito do descaminho do seu país e do mundo. Não querendo ser injusto, conto pelos dedos de uma mão - vá, concedamos, pelos dedos de duas mãos - o número daqueles que perceberam a corrente da história em movimento. É preciso um convívio assíduo com as dinâmicas sociais e históricas para perceber que nada acontece por capricho inopinado.
A hipnose induzida pela oligarquia e seus aliados e financiadores (a banca, os media, os think tanks do mundialismo e os agentes de desvairados experimentalismos que se deixaram enganar pelo conforto da ideologia) rompeu-se. A retribalização que quiseram impor à consciência de sociedades modernas, fomentando guerras e ódios (de género e de sexo, de geração, de raça, de religião, de classe) falhou, pois aqueles grandes agentes de socialização e integração que são desde sempre os pilares das sociedades e dos Estados-nações ( a lei e a ordem, a conformidade e a integração, a ideia do Mesmo e do estranho, a ideia de fronteira étnica, social, linguística, cultural económica) soaram a rebate perante a iminência de um desastre irreparável.
Deito-me, já um novo dia se preparara para despontar, feliz por não ter tido medo de encarar a história que se movimentava sob os nossos pés. Àqueles que comigo comungaram nesta percepção da mudança do eixo da história do nosso tempo - como, aliás, já o haviam feito no que respeita à Rússia, ao Brexit, às guerra na Síria, na Líbia e no Iraque - só posso lembrar que estávamos certíssimos. Aos outros que nunca se conseguem afastar do nível primário e emocional reactivo, que tudo psicologizam, fulanizam e que tudo transformam em caricatura, é tempo de iniciarem um caminho mais exigente, pois a história mudou hoje. Isto não se fica pelos EUA: amanhã será na Áustria, em França, na Escandinávia e na Alemanha.
O mundialismo arrogante parece ter sido inapelavelmente ferido, mas tentará certamente lamber as feridas e insistir na mesma receita que se mostrou iníqua para o povo americano, para os povos europeus e para os povos do Médio Oriente e da África, perante cujo sofrimento nos devíamos encher de vergonha. Hoje inicia-se a reinvenção política do Ocidente; hoje, triunfou a rebelião pacífica contra as más elites que trouxeram a crise financeira, a crise económica, as guerras de agressão, a manipulação por atacado de sociedades que se julgavam maduras. A paz parece ter triunfado. Haja Deus !

"Donald Trump foi sujeito à maior e mais violenta campanha de ataques pessoais que alguma vez vi na minha vida. Todos as principais publicações alinharam entusiasticamente.A eleição de Donald Trump foi um triunfo da democracia e uma derrota profunda dos meios de comunicação social."

Palavras do MEC que poderiam ter sido minhas.